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Acqua Toffana

Sinopse

Acqua toffana é um veneno da Renascença. “É líquido, transparente, sem sabor e sem cheiro. Uma gota por semana faz a pessoa morrer em dois anos. Causa dores de cabeça, enjoos, náuseas.” A explicação está no livro de estreia de Patrícia Melo, lançado em 1994, que ganhou justamente o nome da poção mortífera. Nele, duas novelas desenrolam-se como o itinerário caprichoso da morte lenta, planejada como uma arte ou desenhada como delírio. No labirinto narrativo de Acqua toffana, afinal, nada é o que parece ser. O ritmo ágil da prosa de Patrícia, entrecortado e construído em primeira pessoa, ludibria o leitor, fazendo cair uma cortina atrás da outra, e revelando uma natureza sombria na qual o impulso assassino fica entre a patologia e a luxúria. Na primeira história, a protagonista, de nome desconhecido, tenta convencer um delegado de que seu marido é o assassino que estuprou e estrangulou várias mulheres no bairro paulistano da Lapa. Na segunda, o metódico funcionário de um cartório passa a ser atormentado pela presença de uma vizinha, e desenvolve um plano para matá-la. Em ambas, desfilam tipos tão banais quanto esquisitos. Em contraste com psicopatas, sádicos e maníacos, há a senhorinha de cabelo acaju, a vizinha e vítima da segunda novela, que irrita o protagonista com seus chinelos de pano, suas unhas lascadas e sua coleção de sacos de supermercado. Há a descrição satirizada da decadência do casamento; há a onipresença de uma tela de TV, vomitando sinopses de filmes e noticiários sensacionalistas. Mas há, sobretudo, o elemento-surpresa: aquele que atribui ainda mais requinte ao já sofisticado universo de assassinos-artesões. “No Brasil, um crime só merece atenção se for uma obra de arte. Queremos os canibais, os perversos, os hiperviolentos, os científicos. Queremos os melhores”, diz a protagonista da primeira novela. Pois Acqua toffana trata não do criminoso corriqueiro das esquinas, e sim dos assassinos sofisticados que se escondem em tipos familiares — e que, por isso mesmo, conseguem dedicar-se com afinco aos seus métodos e à sua frieza. Como que munida de aparato cinematográfico, com suas câmeras e mesas de edição, Patrícia Melo trabalha enquadramentos que embaralham, a todo instante, as diferentes versões para cada trajetória de violência. Ao mesmo tempo, a sensação de estar dentro da mente de um psicopata é despistada por um humor ácido e ágil — uma das características mais marcantes da autora. A reedição de Acqua toffana, ao lado de O matador, marca a chegada de Patrícia Melo à Rocco. A editora vai relançar, com novo projeto gráfico, todos os livros da autora.